sábado, 10 de abril de 2010

Ele não é porque nunca foi



 E se eu dissesse que Deus me mandou matar? Não, eu sei o que isso parece, não sou um idiota. Mas se a partir do momento em que os homens criaram Deus ele passou a existir, me parece razoável que se eu o vejo me dando ordens ele realmente está me dando ordens. Quero dizer, por que eu sou louco e outros conseguem isenção nos impostos? Ok, enquanto o Deus que os homens acreditam prega o amor, meu desejo é assassino, mas não sejamos idiotas – me esforçarei para não sê-lo. Deus ordenou que seu único filho se deixasse ser açoitado e pregado em uma cruz e isso me parece uma maluquice semelhante a Ele aparecer para mim e dizer “mate”. Não me parece (a primeira vista) muito racional, ademais, milhões de pessoas, em diferentes épocas, travarem guerras e mais guerras em nome do amor de Deus.
Ora, não há nada de esquisito em matar em nome do amor, tampouco é paradoxo – façamos um esforço para não sermos estúpidos, para vermos a idéia de amor como uma coisa mediata; a violência é, nessa condição, razoável. Nossa cegueira diante desta verdade consiste no fato de estarmos presos a uma soma de códigos morais que nos fazem ver o amor como início, meio e fim, enquanto na verdade, salvo curtas experiências – ilusões – o amor sequer existe. E se houve um grande engano?
E se Deus nunca tivesse falado sobre amor? “Assim como vocês me inventaram, eu os inventei e vocês inventaram o amor”, a ordem me é confusa, mas o conceito faz sentido. E assim entenderam tudo errado, então Deus não me disse apenas “mate”, ordenou “mata-me”. “Como?”, indaguei em minha ingenuidade genuinamente humana. Nada. Deus não respondeu em sua genuína ausência divina, porque ele está em todos os lugares o que me parece quase o mesmo que não estar em lugar nenhum.
“Você já o matou, posto que ele nunca nasceu”, me disseram. Mas só pode morrer aquilo que vive, só diz “mata-me” os vivos. E estou certo de que as coisas só existem na medida em que damos vida a elas, o mesmo vale para nós. Só vivemos e saímos por aí postulando besteiras porque acreditamos nisso e, do mesmo modo, as pedras só não estão vivas porque assim cremos. Mas, se a partir de um dado momento começarmos a falar com as pedras e a ouvirmos responder, seria, ao que me parece, correto dizer que as pedras falam. Assim como, do mesmo modo, quando acreditamos que Deus existe, ele realmente existe, porque o que existe só existe porque assim queremos – é tudo cria nossa.
Deus criou os filósofos para que eles provassem sua existência, os filósofos criaram e provaram a existência de um Deus que criou outros filósofos que mataram a Deus. Mas ele ainda vive, porque Nietzsche só o matou enquanto morto, matou um Deus morto, é preciso matar ao Deus vivo, posto que o morto já mataram.
Mas que missão dos diabos... Deus é um cara ardiloso, você o mata hoje e ele ressuscita ainda mais glorioso três dias depois, sempre haverá um idiota para ressuscitá-lo e fazê-lo subir aos céus; então, veja bem, minha conclusão é lógica, ainda que você vá me chamar de louco apesar de tudo. A conclusão é que Deus ao pedir para matá-lo, pediu para que eu matasse a humanidade, pois assim mato Deus hoje e ninguém o ressuscita três dias depois. Por precaução mato a mim mesmo em seguida, afinal não confio em mim mesmo, não posso garantir que em um momento de medo e tristeza, em meio a solidão (em função da extinção da humanidade) eu não venha a ressuscitar a Deus – nunca esqueçamos, basta um pensamento e Ele está de volta, nunca duvidei de seu poder, recomendo que também não duvidem.
Só estou refletindo, colocando em linhas lógicas o que parece loucura. Explicando o que você, idiota, não entenderá, negará e negará porque lhe é conveniente, mas, sobretudo, porque és ridículo, covarde e idiota. Ria de mim, mas não me julgue; não enquanto o sangue não tiver sido derramado, até então sou um cara normal, pois o que diferencia um psicopata de um normal é matar. Pensar em matar não dói e não machuca, todos pensam, talvez até mesmo você, é possível e provável que em cada esquina das ruas de seu bairro, neste exato momento, alguém esteja pensando seriamente em matar e, no entanto, nenhum deles é louco, pois suas “loucuras” estão enclausuradas em suas mentes, enquanto a minha eu escrevo, pois a diferença entre eu e você, hoje, é que não sou hipócrita. Amanhã serei o assassino de Deus e aí sim, concordo, serei completamente diferente de você, idiota.